As medalhas da DESONRA – Quem de nós nunca utilizou a “técnica do azeitamento”, isto é, usou de meias palavras, de elogios falsos porém melados, de flagrante bajulação para, logo em seguida, após ter “amaciado a carne”, tentar arrancar algum favor de outrem? Também a usam as instituições humanas. Que são feitas de homens. Que não são melhores do que nós. Então o que esperar delas!?
O caso é que, quando o azeitamento se institucionaliza e se torna um “modus operandi”, não prejudica a uma ou duas pessoas apenas, prejudica geralmente a uma comunidade, a uma classe, a um estamento. A “técnica” política se torna uma arma estratégica.
Em tempos de Lei 13.954, para “azeitar” a máquina da reestruturação da carreira militar, as Forças Armadas, reconhecidamente incompetentes nas lides democráticas, viram no instituto das medalhas um mecanismo promissor no obscuro jogo político de aprovação da lei de “proteção” social dos militares.
Os deputados Vinícius de Carvalho e José Priante, que foram respectivamente relator e presidente da comissão que aprovou o PL1645, que por sua vez pariu a Lei 13.954, foram escolhidos (teria sido num bingo!?) pelo Ministério da Defesa (o Ministério Invisível) para receber as condecorações e o título de grande-oficial! Esta nova é velha, não assusta mais.
Nada demais amedalhar alguma “personalidade (…) que haja (realmente) prestado relevantes serviços à Marinha”, ao EB ou à FAB. Mas e quando a tal “personalidade”, além de não ter prestado nenhum tipo de serviço, ainda tem o poder de influir em decisões duvidosas à favor de uma camada, um estamento específico das Forças Armadas? Ilegal? Não chega a tanto. Mas bizarro e imoral, com certeza.
A história militar brasileira recente mostra que essa perversão vem de longa data… Quantos militares sabem que no auge da Guerra Fria (1975), o general presidente Ernesto Geisel condecorou o ditador comunista da Romênia, Nicolae Ceaușescu, com a Ordem do Cruzeiro do Sul? Um genocida comunista caído nas graças de um general brasileiro… que para dar vazão à sua tara ideológica, sem corar, condecorou o tirano vermelho. Quais teriam sido os “grandes feitos” para o Brasil, que justificaram tal reverência? Nunca saberemos. Também nunca saberemos por que Ernesto “Che” Guevara, que dispensa apresentações, levou uma medalhinha dessas para Cuba… Definitivamente o Brasil não é para amadores!
A medalha militar é uma honraria, é uma “distinção que enobrece”, é materialização da honra. Não é moeda de troca. Não é uma maneira galante de “molhar a mão” do “guardinha” da esquina para não ser pego na “blitz”. Não é presentinho que se dê àqueles que de alguma forma nos agradam. Merece todo respeito por aquilo que representa. E como recurso público que é, precisa e deve ser escrutinado por qualquer cidadão. Qualquer um. Seja civil ou militar, oficial ou suboficial. Quem é dono da honra? Quem está dando a medalha a quem quer que seja? Não é o presidente nem o general, mas sim o povo brasileiro. E quem é o povo senão cada indivíduo sobre este solo?
A Revista Sociedade Militar recentemente questionou a Marinha do Brasil sobre a moralidade e a transparência na entrega de medalhas aos insignes políticos já citados e obteve como resposta um deboche digno de Franz Kafka: segundo a alta administração naval, a partir do ano 2119 os motivos do amedalhamento poderão ser de domínio público!*
Esses episódios valem como alerta ao povo brasileiro. Os que votaram ou ainda votarão em militares para cargos eletivos pelo Brasil afora precisam saber. Precisam se desiludir da falácia de que os futuros vereadores, deputados ou presidentes, pelo fato de serem sargentos, capitães ou generais, são necessariamente conservadores, honestos ou representantes da mais alta moral terrena. Se possuem tais atributos enquanto estão na ativa, é bom que se saiba que muitas dessas qualidades não são pessoais, mas obrigações legais e regulamentares. Militar honrado é um pleonasmo! Desfeito o liame constitucional entre o soldado e a caserna, resta o homem, que pode ser ganancioso, ávido por poder, traidor, pronto a sacrificar os mais próximos – mesmo aqueles que o sustentaram – no altar do poder.
Todos são soldados, mas uns são mais soldados do que os outros…
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*Em tempo de “fake news”, uma notícia, venha de onde venha, não é verdade por muito tempo. A Marinha do Brasil, como alguém a andar na prancha, mudou a versão e agora informou ao Ouvidor Geral da União que os documentos que subsidiam as propostas para escolha das personalidades a serem amedalhadas foram “descartados” na “cesta seção”, isto é, jogados no lixo! Esperamos que não tenham sido lançados ao mar…
J.Reis Moreira