“O termo política é derivado do grego antigo (politeía), que indicava todos os procedimentos relativos à Pólis, ou cidade-Estado grega. Por extensão, poderia significar tanto cidade-Estado quanto sociedade, comunidade, coletividade e outras definições referentes à vida urbana.”¹
Alguns episódios da história brasileira, que se desdobraram em eventos políticos foram estrelados por militares. Alguns foram motivados por causas nobres. Outros nem tanto. Um dos que mancham a reputação das Forças Armadas foi a proclamação (ou mais apropriadamente o golpe) da República. Traído por um complô rasteiro urdido por oligarcas e alguns generais (sempre eles!) do Exército, o governante mais amado do Brasil (D. Pedro II) e sua corte, foram banidos para Portugal, em mais um exemplo de que hierarquia e lealdade não andam de mãos dadas.
Já o lado luminoso da força, dos que se insurgem corajosamente por causas nobilíssimas, pode ser representado pelo Cabo João Cândido Felisberto, também conhecido como o “Almirante Negro”. Cabo da Marinha, ele foi o herói da conhecida Revolta da Chibata, que foi o último, pelo jeito o único, recurso que fez os engalanados almirantes suspenderem os duríssimos castigos físicos infligidos aos marinheiros.
Em 1963, no governo João Goulart, ocorreu a interessante e pouco conhecida revolta dos sargentos (ô povinho revoltado esse!). Ecoando o texto da Carta Magna de 1946, os juízes do STF (que só rasgam a Constituição quando lhes convém!) declararam os sargentos inelegíveis. Na madrugada do dia 12 de setembro, cerca de seiscentos graduados da Aeronáutica e da Marinha, entre cabos, sargentos e suboficiais, apoderaram-se dos prédios do Departamento Federal de Segurança Pública (DFSP), da Estação Central da Rádio Patrulha, do Ministério da Marinha, da Rádio Nacional e do Departamento de Telefones Urbanos e Interurbanos. O Exército de Caxias interveio e acabou com a festa. Como sempre, a revolta terminou em pouco inquérito e muita cadeia.²
Talvez por medo da verve política latente na caserna, um vírus ideológico, possivelmente inoculado pela intelectualidade bem pensante brasileira, apregoou que o militar é apolítico. Isto é o maior dos absurdos e foi incorporado como verdade. Se política é basicamente a administração da “pólis”, como o militar pode ser alheio a isso? Todo militar, do soldado ao general, é um administrador político. Ele pode ser apartidário ou até mesmo antipartidário, mas jamais apolítico.
É óbvio que a obediência ao art. 45 do Estatuto Militar é inquestionável. Mas apenas por parte da tropa em atividade. Os veteranos têm sua liberdade de expressão e de consciência política resguardadas pela Lei nº. 7.524, de 17/7/1986, que faculta “ao militar inativo, independentemente das disposições constantes dos Regulamentos Disciplinares das Forças Armadas, opinar livremente sobre assunto político, e externar pensamento e conceito ideológico, filosófico ou relativo à matéria pertinente ao interesse público.” Sendo lei específica sobre o tema, sobrepõe-se a qualquer outro diploma legal que trate subsidiariamente do assunto. Portanto, as manifestações esperadas para os dias 20, 21 e 22 de outubro de 2020 (o Outubro Militar) estão perfeitamente dentro da legalidade, e a democracia pátria só tem a ganhar com elas.
“As grandes manifestações do Outubro Militar em 20, 21 e 22, podem ser o início de um movimento organizado de conscientização política por parte dos militares das Forças Armadas, em especial dos praças veteranos (sargentos e suboficiais)”.
As grandes manifestações do Outubro Militar em 20, 21 e 22, podem ser o início de um movimento organizado de conscientização política por parte dos militares das Forças Armadas, em especial dos praças veteranos (sargentos e suboficiais). Estes que estarão em Brasília representarão a todos os que entenderam a mensagem dos maus políticos, que disfarçados de bons soldados, traíram a confiança dos que os elegeram. O estelionato eleitoral é golpe conhecido vindo de um político, mas não de um militar! Esta foi a verdadeira facada! Por isso é importante que todos os militares, mas principalmente os veteranos, cada um à sua maneira, voluntariamente, cultivem a consciência de que é um cidadão, e portanto é tão politizado quanto qualquer um. O direito constitucional de associação é pleno e extensivo inclusive aos militares da ativa e se for bem usado, pode ser um bom instrumento de fortalecimento da consciência política militar. Por exemplo, o Clube Militar, “que se tornou a Casa da República”, apesar do adjetivo, é uma associação exclusiva de oficiais. Por que não fundar uma instituição semelhante de atuação nacional, só para a suboficialidade?
Mas o preço da liberdade é a eterna vigilância. A exemplo do movimento “praça vota em praça” é preciso cuidado para não se precipitar no delírio da simplificação classista. Casos como do subtentente Hélio Lopes, suboficial Gonzaga e outros, são provas de que classe não define caráter. Os lobos sempre estarão junto ao rebanho. Mas hoje, principalmente com a ajuda dos meios de comunicação instantânea, é muito mais fácil localizar um potencial traidor e democraticamente desmascará-lo antes que seja tarde. Antes que sejamos nós a ter de usar máscara… de palhaço!
Reis //
¹https://pt.wikipedia.org/wiki/Pol%C3%ADtica
²http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/Jango/artigos/AConjunturaRadicalizacao/A_revolta_dos_sargentos
³Art. 45. São proibidas quaisquer manifestações coletivas, tanto sobre atos de superiores quanto as de caráter reivindicatório ou político.
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