Muitos perguntam: “onde estão os votos?” Talvez devessem perguntar: “em quem votar?”
Passadas as eleições municipais, os nativos do Veteranistão ainda estão com gosto de cabo de guarda-chuva na boca. A força armada digital, baseada principalmente em whatsapp e telegram, viu suas mais altas e, cá entre nós, presunçosas esperanças naufragarem num mar de votos, se não contrário, pelo menos alheio aos seus anseios e projeções. Fizemos algo errado? Ou melhor, chegamos a fazer alguma coisa?
Uma “campanha” iniciada já há algum tempo, chamada “praça vota em praça”, parece estar ganhando corpo entre os veteranos. Como se vê, ela é autoexplicativa e excludente. Não se vota em oficiais. Mas votar só em praças (subtenentes, sargentos, cabos e soldados) talvez não seja uma estratégia das mais sólidas. Tivemos exemplos recentes de que não é a categoria do militar (oficial ou praça) que determina a sua coerência política e muito menos o seu caráter pessoal. É certo: nenhum oficial de nenhuma Força Armada ou Auxiliar dignou-se a levantar a voz contra a tramoia da Lei 13.954/19, que descaradamente içou os generais de Bolsonaro ao teto do funcionalismo público, às custas dos veteranos e das pensionistas. Mas a “campanha” “Praça vota em praça” não pode ser tão somente uma luva de pelica usada para afrontar os que nos sabotaram, lá em dezembro de 2019. É preciso mais do que um slogan segregacionista para captar os votos dos veteranos, principalmente depois das experiências com o deputado Hélio Lopes e outros. Mas, por outro lado, corre-se também o risco de se enveredar pelo caminho da contradição ambulante: muitos apostam suas fichas no senador Olímpio, que tem sido uma voz a favor do cumprimento do acordo feito entre o Governo e o Senado. Ele não é praça, é oficial… Aprendemos mais rápido com os inimigos do que com os amigos, sem dúvida, mas é preciso rapidamente transmutar o aprendizado em ação. Pautas e programas genéricos não são mais suficientes para angariar apoios. A politização dos militares, principalmente os da reserva, veio para ficar e não tem volta.
Bolsonaro, que parecia ser carta fora do baralho, provou ser uma força ainda latente entre os veteranos, como um calo ou um espinho na carne. De maneira oblíqua guiou os votos dos militares. Os que ainda não despertaram para o real significado da Lei 13.954/19 e apoiam cegamente o capitão só votaram em candidatos apoiados por ele, e juram que “a esquerda morreu”. Já os que vivem no mundo real dos que têm contas a pagar renegaram qualquer candidato apoiado pelo “Mito”, como se ele, o Presidente, estivesse invisivelmente direcionando nossas inclinações políticas. Algo como um voto de cabresto às avessas. Indubitavelmente houve uma clivagem no Veteranistão.
As associações, que deveriam ser nossa principal arma de combate na selva política, mostraram-se meros clubes de velhinhas saudosistas e míopes. Algumas, patinando sobre um mar de gelo fino, declaram-se contraditoriamente bolsonaristas. Levando ao extremo a síndrome de Estocolmo, seus acólitos seguem apaixonados pelo “Mito” que os seviciou e os deixou mais perto da classe C. Outras associações com seus associados, que optaram por viver a feliz aposentadoria comemorando aniversários e se dando medalhas uns aos outros, não passam de “água de salsicha”, só servem para “pesar a lata”! Isso sem mencionar as que se especializaram em fazer jogo duplo…
Se Bolsonaro foi a maior aposta política da ala militar, fracassamos. Mesmo os generais, que devem suas gordas aposentadorias a ele, já notaram que se “escoraram em pau podre” e parecem ensaiar uma urgente autodefenestração. Se o Mito foi o azarão da direita brasileira, a esquerda logo, logo, voltará, pois ele tem demonstrado falta de coragem e talvez até de interesse em desaparelhar a máquina estatal. A nós do Veteranistão o que ficou? Ser apenas coronel, sargento ou soldado já está deixando de ser credencial suficiente para se ganhar uma eleição. Carecemos de um discurso minimamente coerente e robusto, que não se apoie unicamente em pautas vagas e fáceis ao estilo “Deus, pátria e família”. Esta parece ser a undécima hora. O momento de propor um caminho difícil, mas palmilhável. Quem se apresenta para abrir a primeira picada?
JB Reis
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